terça-feira, 31 de janeiro de 2017

À espera de chuva, Agreste sofre com "pior seca do século"

Governo promete investimentos, mas perspectivas são nada animadoras para a região. Segundo a APAC, a situação deve piorar

Alexandre Cunha - Leia Já

Chão rachado onde antes fluía água. Registro feito na Barragem do Bitury, em Belo JardimAlexandre Cunha/LeiaJáImagens

"Tinha peixe, muitos pescadores vinham pra cá. Olhe lá os barcos encostados. Aqui era cheio de plantio: coentro, alface, feijão, milho. Agora? Agora vamos esperar por Deus". Sob o sol impiedoso do Agreste pernambucano, o agricultor José Rodrigues Tavares, 70 anos, observava da sua casa a Barragem do Bitury, em Belo Jardim. Seca, completamente seca. No relato de quem, há mais de 30 anos, é vizinho do local, há um misto de melancolia e esperança por dias melhores.

A pior seca do século, como tem sido considerada por muitos, atingiu de maneira devastadora os municípios agrestinos. Desde 2012, todos os anos chove menos que o esperado na região. Dezenas de barragens entraram em colapso, como Bitury e Pedro Moura Júnior, em Belo Jardim, e a principal do Agreste, Jucazinho, no município de Surubim. "Muita gente tá começando a sair daqui. Indo pra Petrolina, pra um bocado de canto. A crise tá séria e é pra todo mundo", lamenta José Rodrigues ao comentar sobre os moradores locais. 

Sem água nas torneiras, a população fica à mercê de carros-pipa e poços artesianos. Nivaldo Francisco Lins, nascido em Belo Jardim há 56 anos, trabalha como distribuidor de galões de água na cidade. "É de cortar o coração. Situação dramática. É a pior (seca) de todos os tempos e isso já era para (o Governo) ter cuidado há muito tempo". 

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A ausência de recursos básicos impacta diretamente a criação de animais e muitos perecem. Nas proximidades de São Caetano, carcaças e ossadas de cavalos eram o reflexo do cenário preocupante na região. O racionamento de água é cada vez mais rigoroso. Nesta segunda-feira (30), a Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) confirmou um novo calendário de abastecimento para quatro cidades do Agreste: João Alfredo, Bom Jardim, Orobó e Surubim. Estas duas últimas passarão a ter um rodízio de dois dias com água e 24 sem. A medida é para preservar o pouco de água restante na Barragem de Pedra Fina.

Bilhões investidos, obras arrastadas 

Lançada em 2004, a homérica obra de transposição do rio São Francisco segue em câmera lenta. Em agosto do ano passado, o governo federal lançou o Plano Novo Chico e prevê, até 2028, investimentos de mais de R$ 10 bilhões. O projeto afeta a vida dos moradores do Sertão e Agreste de Pernambuco. Nesta segunda (30), o presidente Michel Temer veio ao estado para inaugurar a terceira estação de bombeamento do Eixo Leste da obra, na cidade de Floresta.

Antes da transposição, o governo de Pernambuco promete acelerar os serviços da Adutora do Agreste, iniciada em 2013, cujo orçamento total é de R$ 1,4 bilhão. De acordo com a Compesa, dos 420 quilômetros da adutora, quase 300 estão prontos (cerca de 70%). Interligada à do Agreste, a Adutora do Moxotó também ganhará celeridade nas obras, segundo o governo do Estado. São R$ 100 milhões em investimentos e uma previsão de entrega para março de 2018. 

José Rodrigues relembra com nostalgia como a barragem era

Alexandre Cunha/LeiaJáImagens

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Há ainda R$ 60 milhões destinados ao Sistema do Pirangi, que deve levar água do município de Catende, na Mata Sul, para a Barragem do Prata, em Bonito, beneficiando dez cidades do Agreste. Entre outras obras em andamento estão a da Adutora do Siriji (R$ 33 milhões investidos), a recuperação da Barragem de Jucazinho (R$ 53 milhões), a transposição do Rio Serinhaém (R$ 2,1 milhões) e a ampliação no abastecimento de água de Limoeiro (R$ 1,6 milhão).

Não há previsão de melhora

A Agência Pernambucana de Águas e Clima (APAC) oficializará a previsão para os municípios do agreste no mês de março. De antemão, o Gerente de Meteorologia e Mudanças Climáticas do órgão, Patrice Oliveira, explicou que as perspectivas não são as melhores. 

"Nós teríamos que ter um ano muito chuvoso para melhorar a situação. Coisa que em 2017 não vai acontecer. Não temos parâmetro algum que diga que será um ano chuvoso". De acordo com Oliveira, tanto a agricultura como os recursos hídricos continuarão a sofrer o impacto da longa estiagem na região. 

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