No auge do PAC, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o Exército tinha R$ 1,2 bilhão em obras contratadas com o governo federal. Agora, na gestão de Jair Bolsonaro, os militares conquistaram, até o momento, apenas a obra emergencial de uma ponte, orçada em R$ 547 mil. Desapontado, depois de se preparar com equipamentos e pessoas, o Exército pressiona e tem, pela primeira vez, a promessa de novos contratos. Mas estas obras não serão tão importantes como no passado. 

Além da ponte no Amazonas, o Exército deve fechar, ainda neste ano, o contrato de manutenção da BR-226 no Rio Grande do Norte, um negócio avaliado em R$ 60 milhões. Além disso, os militares olham outras duas obras, que só deverão sair do papel em 2020: melhorias na BR-452, em Minas Gerais (R$ 139 milhões) e a duplicação de cerca de 10 quilômetros da BR-101 em Alagoas (R$ 80 milhões). Mas nem mesmo para estes trechos há garantias de que serão concedidos. 

“O exército está mais preparado que nunca. Após o boom das obras do PAC foram comprados equipamentos de ponta e uma nova geração de engenheiros foi formada. Mas com os contratos acabando, isso tudo poderá ficar ocioso”, disse um militar de alta patente, sob sigilo.

O presidente Jair Bolsonaro não cansa de elogiar o exército e mostrar, nas redes sociais, obras que os militares fazem pelo país, principalmente em rodovias. O presidente que mais contratou o exército foi Temer, com 32 obras, seguido de Dilma e Lula. Em sete meses Bolsonaro só assinou um contrato, contra média anual de 6,4 desde 2003.

E  estas são obras concedidas em governos antigos, que estão próximas do fim. De fato as duas maiores obras que estão hoje com os fardados (duplicação da BR-116 no Rio Grande do Sul, em contrato de R$ 207 milhões, e pavimentação da BR-163 no Pará em contrato de R$ 140 milhões) foram concedidas em 2017 e 2018 pelo governo de Michel Temer, com seu fim já previsto no curto horizonte. Das atuais 30 obras em execução pelo Exército, 16 acabaram ainda em 2019. 

Obras para o exército
por mandato presidencial
MANDATO
QUANTIDADE DE OBRAS
6
1º mandato de Lula
2º mandato de Lula
1º mandato de Dilma
2º mandato de Dilma
Mandato de Temer
Mandato de Bolsonaro
Média por ano
18
29
10
32
1
5,67
Total de obras realizadas
96
Fonte: Exército

Isso ocorre, segundo fontes do setor,  por causa das restrições orçamentárias que cortam em cheio os investimentos e pela necessidade de se ampliar empregos no país, o que ocorreria se empreiteiras privadas assumissem essas construções. O uso massivo do Exército como empreiteira ocorreu no segundo mandato do presidente Lula, quando a economia crescia e os militares foram acionados para resolver gargalos como a duplicação da BR-101 no Nordeste, a construção do aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN) e a execução da Transposição do São Francisco.  Na época, o Exército chegou a figurar como uma das grandes “empreiteiras” do Brasil.

O Dnit confirma que, além destes trechos, o Exército poderá assumir obras no Maranhão e no Amapá, em trechos que somente serão concedidos no longo prazo.

"Esta parceria já é antiga. Para o Exército é bom para o adestramento de seu pessoal, como chamamos o treinamento. Para o Dnit conseguimos obras com qualidade e preço razoáveis", afirmou o general Antônio Leite dos Santos Filho, que coordena o Dnit no Ministério da Infraestrutura. 

A falta de recursos orçamentários explica parte deste problema. Mas o Dnit, embora não esteja na velocidade que gostaria, continua contratado. Dados compilados pela RHS Licitações apontam que, de janeiro a 25 de agosto deste ano, foram contratadas 237 obras e manutenções, uma alta de 9,7% sobre o número de contratos em igual período de 2018. Ou seja, enquanto o Dnit concedeu uma obra ao Exército em todo o período, segundo o levantamento, foi concedida uma média de uma obra por dia à iniciativa privada. A maior parte destes contratos dizem respeito à manutenção dos cerca de 50 mil quilômetros sob responsabilidade do Dnit.

Exército em obra de duplicação da BR 101 próximo à Goiana, em Pernambuco, no dia 16 de janeiro de 2006 Foto: Hans Von Manteuffel / Agência O Globo
Exército em obra de duplicação da BR 101 próximo à Goiana, em Pernambuco, no dia 16 de janeiro de 2006 Foto: Hans Von Manteuffel / Agência O Globo

No auge, o Exército tinha R$ 1,2 bilhão do PAC. Este dinheiro ajudou a modernizar o exército e treinar pessoal. Agora, este grupo corre o risco de ficar desocupado. “Por causa destas obras equipamentos de última geração, até em áreas como terraplenagem, estão sem uso”, disse o militar de alta patente que falou com ÉPOCA, acrescentando que a prioridade do Exército seriam obras de rodovias e ferrovias. “ Um desafio incrível seria obras profundas de melhoria na Transamazonica, mas isso nem está no radar do governo. Outra área que queríamos ampliar nossa atuação é em ferrovias, mas também não há muitos projetos”. 

Oficialmente em nota, o Exército reconhece que os contratos são menores pela restrição orçamentária e afirma que quer mais obras, porém que só vai comentar após as negociações com o governo. “As Obras de Cooperação realizadas pelo Exército em parceria com diversos Órgãos Públicos proporcionam uma importante contribuição ao desenvolvimento Nacional, sendo uma das atribuições subsidiárias do Exército, conforme a Lei Complementar LC nº 117, de 2/9/2004. Nesse sentido, para o Exército Brasileiro essas obras proporcionam o adestramento dos quadros em atividades de construção, com a consequente formação de mão de obra qualificada a ser empregada pela Sociedade”, diz o documento. “As Obras de Cooperação têm sido importantes para a aquisição de modernos equipamentos de Engenharia, os quais modernizaram a frota dos Batalhões de Engenharia de Construção distribuídos pelo território Nacional”.